Este ano, sem dúvida, o Brasil vai respirar
futebol. Aliás, já estamos respirando. Depois de quase seis décadas e meia, o
país volta a ser o centro mundial desse esporte. Trata-se, afinal, da paixão
maior do nosso povo. Mas existem vozes contrárias à realização da Copa do Mundo
no país. Eu, cá do meu canto, sinto uma imensa vontade de plagiar Nelson
Rodrigues: “Só os idiotas da objetividade não vêem a importância desse fato”.
Poderia até completar com outra máxima do escritor: “Em futebol, o pior cego é
aquele que só vê a bola”.
O nosso cronista maior desse esporte (e,
também, o nosso maior dramaturgo), via no futebol algo que transcendia as
quatro linhas do campo. Nelson usou o futebol para dissecar a alma do brasileiro.
Não é à toa que suas crônicas futebolísticas lançam luzes sobre a formação
cultural do país. Outro que usou o futebol como metáfora foi o grande
romancista José Lins do Rego, autor da seguinte alfinetada: “... há uma
grandeza no futebol que escapa aos requintados”. Isso na época em que a elite intelectual via
o esporte com certa reserva.
José Lins explicou melhor o seu raciocínio:
“Não é ele só o espetáculo que nos absorve, que nos embriaga, que nos arrasa,
muitas vezes, os nervos. Há na batalha dos vinte e dois homens em campo uma
verdadeira exibição da diversidade da natureza humana submetida a um comando,
ao desejo de vitória”. Vejam bem: “diversidade da natureza humana”. Alegria,
vibração, frustração, êxtase, ódio, amor, heroísmo, covardia, expectativa,
decepção, todos esses sentimentos essencialmente humanos estão amalgamados numa
única partida de futebol.
Essas considerações (porque não dizer, este
preâmbulo, ou para usar uma terminologia do jornalismo, este nariz de cera) me
vêm a propósito do livro que acabei de ler, que se chama: “Literatura e
Futebol”. Trata-se de uma publicação especial da Revista Bravo, que foi lançada
em 2010. O organizador da coletânea foi
João Gabriel de Lima. A edição ficou a cargo do tricolor das laranjeiras
Marcelo Moutinho. Destaque especial para o craque das ilustrações Ricardo
Soares. Quem assina a edição de imagens, com fotos espetaculares, é Guilherme
Tosetto.
O livro reúne um timaço de 18 escritores.
Todos tratam, é claro, de um mesmo tema – futebol- utilizando diversos gêneros
– crônica, conto e poesia. O leitor se depara com pesos-pesados da literatura
como Carlos Drummond de Andrade, Ferreira Gullar, João Cabral de Melo Neto,
Rubem Fonseca, Lima Barreto, Luís Fernando Veríssimo, Clarice Lispector (única representante
feminina), Antônio de Alcântara Machado, além dos já citados (não poderiam
ficar de fora de jeito nenhum) Nelson Rodrigues e José Lins do Rego.
O resultado dessa miscelânea é um painel
literário bastante representativo. Ele demonstra como o tema serviu de
matéria-prima para grandes nomes das nossas letras. Mesmo assim, há quem veja
escassez de autores brasileiros que utilizaram esse assunto como mote para suas
criações. Pode até ser. Mas, podemos dizer sem medo de errar: se a quantidade é
limitada, a qualidade não é.
Vale a pena o leitor conferir,
deleitando-se com os textos saborosos do livro. Puxando a sardinha aqui para os
lados do cerrado, eu destacaria como bem representativo dessa obra o
conto do escritor goiano, radicado no Rio de Janeiro, Flávio Carneiro. A história de sua autoria é “Penalidade Máxima”. Ela descreve a tensão que envolve um dos
momentos mais dramáticos do futebol, que, justamente, serve de título ao texto. O que se
passa na cabeça do jogador naquela fração de segundo em que ele vai bater o
pênalti. Essa angústia foi meticulosamente retratada no texto do autor goiano.
Como disse anteriormente, a Antologia
escalou 18 escritores, tal como se faz numa partida de futebol, só que nesse
caso sete ficam no banco de reservas. Nessa seleção literária todos são
titulares. E com isso, os organizadores de “Futebol e Literatura” fizeram um
belo gol: de letra.
Ficha Técnica
Título: Futebol e Literatura
Autor: João Gabriel de Lima (Org.)
Gênero: Coletânea de Literatura Brasileira
Editora: Abril
Páginas: 148
Ano: 2010
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