segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Trevas do Colonialismo


Coração das Trevas, de Joseph Conrad, é um livro instigante. A narrativa é envolvente. A obra prima pelo rigor da linguagem. Isso fica evidente mesmo numa tradução, no caso de Albino Poli Jr., para a editora L&PM Pocket.

Incrível, mas Conrad aprendeu inglês apenas aos 23 anos. Ele era polonês, de Berdichev. Nasceu em 1857. Ainda assim, foi considerado pela crítica um dos mais importantes escritores da língua inglesa de todos os tempos.

O que mais impressiona em Coração das Trevas? A força da narrativa, através de uma apurada técnica literária. Conrad tem um domínio absoluto sobre o tema que desenvolve. Explica-se: ele foi marinheiro durante 16 anos. Percorreu a Ásia, Áfria, América e Europa.

Coração das Trevas obteve um sucesso tão expressivo que ganhou adaptação livre para o cinema (Apocalipse Now), do diretor Francis Ford Coppola. Destaque para a atuação magistral de Marlon Brando como o enigmático Kurtz.

O pano de fundo do livro é o colonialismo e suas consequências: "O horror! O horror!". Denúncia pungente e, ao mesmo tempo, realista. Baseia-se na viagem que o autor fez ao Congo, comandando um navio, quando contraiu malária, entre outros dissabores.

A vivência do autor fica patente em trechos do livro: "Marlow não era um marinheiro típico (excetuando sua propensão a contar histórias), e, para ele, o significado de um episódio não estava dentro como um cerne, mas fora, envolvendo a narrativa que o descobriu apenas como um fulgor iluminando a neblina, na semelhança de um desses nevoentos halos que às vezes se formam invisíveis pela iluminação espectral do luar".

O personagem Marlow, marinheiro como Conrad, é o seu alter-ego. Ele é quem relata os episódios de Coração das Trevas. Um viagem de barco às entranhas da selva africana, tal como fez Conrad. A expedição liderada por Marlow vai ao encontro de Kurtz.

Ele é descrito como um ser que possui "alma de pureza tão translúcida como um rochedo de cristal". E o seu olhar "não podia ver a chama da vela, mas era amplo o suficiente para abraçar o universo inteiro, pungente o bastante para penetrar todos os corações que batem na escuridão".

Publicado somente em 1902, o livro foi escrito em 1896, ano em que nasceu o primeiro filho de Conrad. O livro foi considerado por Jorge Luis Borges "o mais intenso de todos os relatos que a imaginação humana jamais concebeu".

O autor privou da amizade de muitos literatos de sua época. De todos, porém, de quem mais se aproximou foi Henry James. Inclusive, ambos costumavam desenvolver o mesmo truque literário. O narrador das histórias é um dos personagens e a visão unilateral dos acontecimentos se completa com a de outros.

Com isso, o leitor dispõe de pelos menos dois ângulos da história. Tal recurso permite um julgamento com maior objetividade. É o que acontece, justamente, com Coração das Trevas. Conrad escreveu uma extensa obra, a maioria centrada em relatos marítimos. Outros dois livros de sucesso do autor foram Lorde Jim (1900) e Nostromo (1904).

Em 1917, Conrad fez um comentário esclarecedor sobre os seus escritos: "Chamam-me de escritor do mar...Toda a minha preocupação foi chegar ao valor 'ideal' das coisas, dos acontecimentos, dos seres". Quem se ater ao sub-texto encontrará tais significados permeando os seus livros.

Caricatura de Joseph Conrad

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