domingo, 2 de fevereiro de 2014

Bravo! faz um Gol de Letra


Este ano, sem dúvida, o Brasil vai respirar futebol. Aliás, já estamos respirando. Depois de quase seis décadas e meia, o país volta a ser o centro mundial desse esporte. Trata-se, afinal, da paixão maior do nosso povo. Mas existem vozes contrárias à realização da Copa do Mundo no país. Eu, cá do meu canto, sinto uma imensa vontade de plagiar Nelson Rodrigues: “Só os idiotas da objetividade não vêem a importância desse fato”. Poderia até completar com outra máxima do escritor: “Em futebol, o pior cego é aquele que só vê a bola”.

O nosso cronista maior desse esporte (e, também, o nosso maior dramaturgo), via no futebol algo que transcendia as quatro linhas do campo. Nelson usou o futebol para dissecar a alma do brasileiro. Não é à toa que suas crônicas futebolísticas lançam luzes sobre a formação cultural do país. Outro que usou o futebol como metáfora foi o grande romancista José Lins do Rego, autor da seguinte alfinetada: “... há uma grandeza no futebol que escapa aos requintados”.  Isso na época em que a elite intelectual via o esporte com certa reserva.

José Lins explicou melhor o seu raciocínio: “Não é ele só o espetáculo que nos absorve, que nos embriaga, que nos arrasa, muitas vezes, os nervos. Há na batalha dos vinte e dois homens em campo uma verdadeira exibição da diversidade da natureza humana submetida a um comando, ao desejo de vitória”. Vejam bem: “diversidade da natureza humana”. Alegria, vibração, frustração, êxtase, ódio, amor, heroísmo, covardia, expectativa, decepção, todos esses sentimentos essencialmente humanos estão amalgamados numa única partida de futebol.

Essas considerações (porque não dizer, este preâmbulo, ou para usar uma terminologia do jornalismo, este nariz de cera) me vêm a propósito do livro que acabei de ler, que se chama: “Literatura e Futebol”. Trata-se de uma publicação especial da Revista Bravo, que foi lançada em 2010. O organizador da coletânea foi  João Gabriel de Lima. A edição ficou a cargo do tricolor das laranjeiras Marcelo Moutinho. Destaque especial para o craque das ilustrações Ricardo Soares. Quem assina a edição de imagens, com fotos espetaculares, é Guilherme Tosetto.

O livro reúne um timaço de 18 escritores. Todos tratam, é claro, de um mesmo tema – futebol- utilizando diversos gêneros – crônica, conto e poesia. O leitor se depara com pesos-pesados da literatura como Carlos Drummond de Andrade, Ferreira Gullar, João Cabral de Melo Neto, Rubem Fonseca, Lima Barreto, Luís Fernando Veríssimo, Clarice Lispector (única representante feminina), Antônio de Alcântara Machado, além dos já citados (não poderiam ficar de fora de jeito nenhum) Nelson Rodrigues e José Lins do Rego.


O resultado dessa miscelânea é um painel literário bastante representativo. Ele demonstra como o tema serviu de matéria-prima para grandes nomes das nossas letras. Mesmo assim, há quem veja escassez de autores brasileiros que utilizaram esse assunto como mote para suas criações. Pode até ser. Mas, podemos dizer sem medo de errar: se a quantidade é limitada, a qualidade não é.

Vale a pena o leitor conferir, deleitando-se com os textos saborosos do livro. Puxando a sardinha aqui para os lados do cerrado, eu destacaria como bem representativo dessa obra o conto do escritor goiano, radicado no Rio de Janeiro, Flávio Carneiro. A história de sua autoria é “Penalidade Máxima”. Ela descreve a tensão que envolve um dos momentos mais dramáticos do futebol, que, justamente, serve de título ao texto. O que se passa na cabeça do jogador naquela fração de segundo em que ele vai bater o pênalti. Essa angústia foi meticulosamente retratada no texto do autor goiano.

Como disse anteriormente, a Antologia escalou 18 escritores, tal como se faz numa partida de futebol, só que nesse caso sete ficam no banco de reservas. Nessa seleção literária todos são titulares. E com isso, os organizadores de “Futebol e Literatura” fizeram um belo gol: de letra.

Ficha Técnica                     
Título: Futebol e Literatura
Autor: João Gabriel de Lima (Org.)
Gênero: Coletânea de Literatura Brasileira
Editora: Abril
Páginas: 148
Ano: 2010



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